sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

''A Assombração''


Caminhava como de costume pelo cemitério
Procurando em que cova serei eu soterrado
E que maldita caveira será minha vizinha
Era noite, nada se ouvia além dos corvos
E nada se via se não o feixe lunar vindo do céu trevoso...
Corria ali um vento seco e frio
Como um triste avio de tristes espíritos
Arrastava folhas secas como os próprios corpos
E mortas como a própria alma
Eis que surge a aberração,visagem tanto falada
Ó assombração temerosa, entre a bruma devoradora!
E com uma voz de calar mortais e Deuses
Me lança uma pergunta feito um gládio gelado nos ouvidos:

-        Quem és tu, tolo andarilho
Tuas passadas são a mim familiares
O que tanto por aqui curia
Incomodando o sono dos que há muito dormem?

Apesar do medo que congelava a espinha
Com a coragem que nunca tive em vida
Respondi com o peito erguido sem ponderação:

-        O que importa quem sou?
Olhe no sepulcro de meus olhos mortos
E verás um nome, nada além disso importa
O resto é tristeza imunda!

-        Vejo que és um maldito, pobre andarilho
Espera teu ponteiro chegar ao fim
Ou o último grão de tua ampulheta cair
Se és tão triste e a morte desejas
Espere-a como todos esperam
Ou banhe em sangue essa carcaça pútrida que tu vestes…
Vejo na fronte de teu crânio coberto por essa pele fina
Nascer uma flor de agonia
Deixa então com que o manto da morte te encubra
E que venha ao encontro daqueles que perturba

-        Mal sabes o quanto este abraço eu anseio
A última gota para que o copo transborde
E o veneno no vinho que ocasionalmente eu beba
Porém, sou covarde
Podereis ser tu a taberneira de Lúcifer a me servir?
Um trago de impulso pr’eu me encontrar e me perder
E que em um último feixe de luz, uma lâmina rápida
Ou um raio de pólvora certeiro, eu venha a me findar...
Vinícius M. Maciel

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

''Renúncia''


Eu quero lembrar e não mais sentir dor
Quero que lembres também, e sorria
Quero que o passado não seja uma ferida
Então, não chores, tem lágrima em mim o suficiente para nós dois
Meu peito um dia se acalma
Difícil foi ter que desistir
Foi como se meu coração tivesse que mudar de casa
E o meu amor fosse obrigado a se render
Vou seguir, não mais teu sorriso
Quero um abraço amigo – recusaria até um último beijo
Vou, e tenho medo
Quando novamente te olhar, quero encontrar paz nos teus olhos
Quero a tranquilidade, não a de um morto
Vou reaprender a viver (sem ti)
Não direi adeus, direi até logo
Eu te amo, e odeio ter que deixar de te amar
Que a amizade sufoque
Para eu voltar a respirar…
Vinícius M. Maciel

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

''Tenho(?)''



Eu tenho energia elétrica, eletrodomésticos do futuro
Ondas, sinais e falta de tato
E desvalorizo o fogo que há muito fora roubado dos Deuses
Tenho dedos que falam, um telefone bêbado…
Tenho tudo em um quarto, em um espaço quadrado
Quartos, sala, e outra sala
Tenho ocupações, repito, disse que repito, as minhas ocupações
Eu tenho todo um mundo, e tenho um mundo de medos
Meu maior conforto é o conformismo
Tenho um menu de mortes à disposição
 - Qu'é a vida, se não: Abandonos e exageros?
Necessito abandonar tudo, viver
Necessito viver, para não abandonar tudo…
Vinícius M. Maciel

sábado, 5 de janeiro de 2013

''Paixão Hedionda''


Consigo ver o morto que sai do caixão. É hedionda sua paixão, pobre morto putrefacto. Sinto-me assim ao acordar na doce manhã de jasmim, ao mesmo modo do defunto apaixonado, comigo meu coração desgarrado, que ama sem temer morrer. Acorda sempre disposto a se arruinar, como o Sol rui no arrebol... e é a noite que me arremata o miserável gosto, o gosto rude da cal.

- Saiu de sua cripta lânguida, ó Nosferatu, besta infernal!

Estou eu, ante ao desespero
, impávido, como o coveiro está para a enxada e a sepultura, e o moribundo está para a doença e o funeral.
Vinícius M. Maciel