segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

‘’As Quatro Chagas’’

I Nascimento

Foste tu, que nascera nessa casa cheia de dor
Parto sangrento!
Expulsão miserável!
''Não pedi para nascer, ó Deus''!
Sou o aborto abrupto da morte no mundo
Chorei ao ser parido
Mal sabia eu, que a vida inteira seria condenado ao pranto

II Velhice

Dantes de madurar, já apodresci
Decrepito, moribundo, decadente, caduco
Como queira!
Já não mais a beleza da juventude
De experiência só tenho sofrimento
De amores e devaneios
Acabei ficando sozinho

III Doença

Meu coração frágil reluta
Ofegante respira, vagarando o infarto
Meus pulmões, duas chaminés
Há muito não limpas
Feito céu cinza em dia de tormenta
Estomago ulcerado, um matadouro em sangria
Fígado esclerosado, cirroso!
Se um verme fosse diagnosticar-me, diria:
 - A podridão se alastrou, a podridão o tomou
Maldito lázarento!

IV Morte

Enfim...
Vinícius M. Maciel

quarta-feira, 20 de julho de 2011

''Bandeira Branca''

É meu caro
Se foi, era hora
Tudo acabou
A vitória só a morte espera
Perdeu a guerra
Pois nem mesmo a tua milícia
Que tantas batalhas travou
Nem o próprio exército de Átila agüentara
Tu terias de te render um dia
É chegada hora
Toca a trombeta e os tambores de tua retirada
Tua bandeira branca de nada adiantou
Está manchada de sangue, coitada
E a tua velha esposa, a solidão
Aguarda sem retorno a tua volta
Mas sabia que um dia
Um sono que nem Hypnos imaginara
Te tornaria escuridão de vez
E a tomaria seu amor inconsolável
Pois toda lágrima o vento seca
A chuva esconde
E todo rio a correnteza renova

Vinícius M. Maciel

segunda-feira, 4 de julho de 2011

''Cronologia do Dia''

I Tempo

Tenho visto o tempo passar
Tempo esse, o mover da eternidade
Todo o girar e a repetição do relógio e seus ponteiros
Engrenagens traiçoeiras do destino!
Que põem a barba na cara, pelos no púbis e mamas no tórax
Torna o menino em homem
A filha em mãe
E todos em belos defuntos...

II Alvor

Amanheceu...
E é minh'alma que grita, se não o galo
As luzes de calor não mais aquecem
E o Sol dantes tão belo
O meu Lúcifer engaiolado
Nem mais o girassol o segue
- Sou eu, esta flor que todas as pétalas caíram

III Crepúsculo

É chegada a hora
Tu te vais embora com o ocaso
E o ouro do teu brilho
Levado pelos mineiros do horizonte...
Te engole enfim, o mar!

IV Escuridão

Negros lençois encobrem
Pálidos receios como a Lua
Que rouba luz e é mais bela
E torna à mostra o pranto em prata
... Libertinos e vagabundos, cães solitários da noite
Sempre por ai a vagar
Jogando a fuça na porta dos botecos que fecham
Tudo em um eterno ciclo de pesar
Enquanto Damas da Noite desabrocham
Junto aqueles que dormem para não mais acordar
Esperando a morte sem mesmo esperar
Todos nós a mercê do tempo
Que eu sem dormir, o vejo passar...

Vinícius M. Maciel

sábado, 2 de julho de 2011

''Angústias Particulares''

Miséria a minha, ter encarado de perto essas órbitas
Após ter arrancado fora os olhos da Medusa
Mal sabia o que estas profundas feridas guardavam
A imensidão universal das tristezas

Este crânio pomposo me fascina
É do couro cabeludo uma sina
Ser lustrado todos vórmios pelo verme
Ter o encéfalo podre carcomido com o tempo
E a consciência jogada na pocilga dos porcos

Não me ludibria mais essas serpentes
Nem seus amarelos dentes
Por todo o tabaco roubado

Sois o defunto mais cálido dentre os vivos
Que zomba dos que estão mortos ao viver
Meu sorriso é todo de caráter poente
Fecho a cara sempre que anoitece

Tenho andado por ai perdido
Entre sombras monstruosas eloquentes
De todo meu olhar abatido
As particulares angústias do conhaque

Vinícius M. Maciel