quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Válvula de Escape


Põe-te óleo a essas engrenagens
Que de teus sonhos
À mera fantasia
Sem coagulações, eu juro
Assim na rotatória de todo sangue
que me suja as veias
A velha fibra da carne
Aquela mesma imposta na ceia
A dor e a sangria amarga
Sinto, mesmo que na ponta da língua
Toda ferrugem que provém do oxigênio
E apesar disso, com pesar vos digo:
- A todos neurônios perdidos
o luto de meus axônios já gastos!
Pois são sempre
aqueles mesmos entorpecentes
Que como um óculos de lentes do obscuro
Te fazem entornar a realidade de outrora
De teu passado que um dia foi futuro!
Vinícius M. Maciel

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

''Apunhalado''


Tenho dores de estimação
Das quais tento de todas esquecer os nomes
Me engano fácil, e me vejo em prantos muitas vezes sem saber…
Me marcaram a sangue frio, me apunhalaram sem pudor
alguém que disse que amou, como tão cruel pode ter se tornado?
Como objetos alojados, e que se forem retirados
Retiraram também a vida do ferido
Meu coração assim apunhalado, sobrevive e insiste
Mas meu médico me disse que isso mataria homens e cavalos
E que logo meu coração desistiria
Já não posso mais ver os retratos, se não me levam ao estilhaço
E volta a sangrar tudo outra vez…
Vinícius M. Maciel

domingo, 2 de dezembro de 2012

''O Padre e o Suicida''


Não ouvi o que o Padre murmurou no ouvido do morto, provável que despachava a alma do próprio, perdoada, para o céu ou o limbo. Quem sabe, nem o próprio morto deve ter escutado, se finado, não deve ter ouvido. Passava eu pela rua, ao ver aquele suicídio…
Os tolos pombos ainda estavam dispersos, assustados com o baque, e apesar da manhã fria, o sangue que feito cascata corria, ainda estava quente com as células em desespero. Se formou logo um alvoroço, de cochichos e especulações, feito formigas que cercam o doce. Sorte que o Padre por ali passava perto, e com o bafo de café lamentou o morto.
Deve ter sido de fato confortante a brisa que acariciou o magoado rosto, nos poucos segundos de intervalo da queda, e do beijo rente a calçada. Aquele sangue rubro fascinante – e apesar da cena infame, os olhos eram pacíficos de horror, e da maior dor finalmente se livrou.
Vinícius M. Maciel